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Historicamente, a formação da sociedade brasileira se deu de uma forma violenta e opressora, e essa situação ainda possui reflexos importantes na estrutura social atual, tendo em vista o racismo ainda enraizado cultural e socialmente. Por isso, o mês de novembro é dedicado à promoção de discussões acerca da população negra e sobre a importância do combate ao racismo nos diferentes espaços sociais. 

Na saúde, esse debate também se manifesta de forma prevalente, visto que as desigualdades que cercam essa população também alcançam essa área. De acordo com a 2ª edição da revista de Saúde da População Negra, desenvolvida pelo Ministério da Saúde, “a população negra morre mais jovem que a população branca; homens negros de 10 a 29 anos apresentam risco de morrer 80% maior do que os jovens brancos. Mulheres negras da mesma idade, o risco é 30% maior do que o apresentado para as brancas”. 

Ainda de acordo com a revista, o risco de morte é maior tanto nas doenças de causas transmissíveis, como nas não transmissíveis, evidenciando uma maior necessidade de atenção das redes de saúde direcionadas a esse grupo populacional. 

Bruno Reis, coordenador regional da gerência da Atenção Psicossocial (GEAP/DAS) ressalta: 

“Mais da metade da população brasileira é negra (preta ou parda), mas isso não se reflete nas políticas públicas e na ocupação de espaços por essas pessoas na sociedade na mesma proporção. Isso evidencia o quanto nós ainda somos uma sociedade racista”. 

A importância do mês de novembro deve ultrapassar apenas a questão da discussão, promovendo também ações e intervenções concretas que visem desconstruir e melhorar esse cenário, ainda tão precário, destaca Bruno. 

Impactos do racismo na saúde mental das pessoas negras 

A realidade social imposta pelo racismo ainda presente, exemplificada pelo não respeito aos direitos, bem como a constante marginalização dessa população nos diferentes espaços sociais, tem um impacto direto na saúde mental e na qualidade de vida das pessoas negras.  

“A sociedade brasileira é sim racista, e é importante perceber o quanto nós carregamos da nossa colonização aniquiladora e violenta. Isso pode nos possibilitar uma análise de como essa população negra vem sendo vista, entendida, tratada e cuidada nos dias de hoje. É importante também perceber como vem se efetivando a dignidade dessas pessoas, sendo necessário também refletir sobre a valorização da cultura negra e da orientação religiosa, e sobre como essas pessoas têm tido a oportunidade de se inserir na sociedade”, ressalta o coordenador regional da Atenção Psicossocial. 

Todos esses fatores ou a falta deles, têm grande impacto na saúde mental dessas pessoas, como destaca Bruno: 

“A falta de acesso, a falta de cuidado, a falta de direito, a falta de respeito a esses direitos, bem como essa visão estruturada de que elas devem ocupar um espaço inferior dentro das relações sociais que se estabelecem são fatores de grande sofrimento mental para a população negra”, afirma Bruno Reis. 

Ele ainda completa, "nós vivemos com esse impacto do racismo na saúde mental das pessoas negras cotidianamente. A partir do momento que a população tem os seus direitos negados ou estão sem acesso e sem cuidado, isso por si só já traz um prejuízo para a saúde mental”. 

Políticas públicas e a luta contra o racismo 

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Um dos principais pontos trabalhados e discutidos, não apenas durante o mês de novembro, é sobre a necessidade da criação de políticas públicas que tenham como objetivo incluir, dar direitos e promover o acesso à população negra nos diferentes espaços da sociedade. 

Ao longo das décadas, essa parcela populacional precisou lidar com diversas situações de privação de direitos e de oportunidades, situações essas que contribuem para perpetuar a estrutura social desigual ainda vivida nos dias de hoje em diversos âmbitos. O coordenador da Atenção Psicossocial, Bruno Reis, exemplifica que: 

“A pandemia da Covid-19 nos colocou diante de uma situação curiosa dentro do campo da saúde: a população negra foi e ainda é a mais afetada pela morte e pelo desemprego, mas, ao mesmo tempo, as políticas não vão de encontro ao objetivo de atender esse grupo. Acho que isso nos diz sobre o quanto ainda somos carentes no campo de políticas públicas antirracistas e inclusivas para essas pessoas, e nos mostra o quanto ainda precisamos avançar em busca da redução de desigualdades”. 

Bruno Reis afirma ainda que “é necessário pensar em políticas públicas que promovam direitos para a população negra e, para isso, é preciso incluí-las. As políticas antirracistas devem ser políticas de inclusão. É preciso pensar em todos os campos, propondo construções no campo da educação, cultura, saúde pública e esporte, de forma a reduzir danos e produzir igualdade”.  

Como a FeSaúde trabalha na Rede Atenção Psicossocial (RAPS)? 

A atuação da FeSaúde na RAPS é ampla, contando, no momento, com duas frentes principais. A primeira é a frente de promoção de desconstrução interna: 

“Nós precisamos ser formados para essa desconstrução e a FeSaúde tem de alguma forma proporcionado espaços de debate e de diálogo para trabalhar a formação dos seus servidores, a formação de quem está na ponta da Rede de Atenção Psicossocial para promover a inclusão, o acesso e o cuidado da população negra de uma forma muito contundente e cuidadosa. Nós temos um grupo de trabalho estabelecido especificamente para trabalhar essas questões e é um grupo de trabalho que está levantando propostas e discussões que serão trabalhados na nossa 5ª Conferência de Saúde Mental”, afirma Bruno. 

A segunda frente está relacionada à promoção de debates e discussões de amplo acesso da população: 

“Nós da RAPS estamos promovendo diversas ações nos serviços de saúde mental esse mês, com atividades voltadas para o mês da consciência negra, oferecendo várias oficinas, debates, rodas de conversa, voltadas para o tema tanto com os profissionais, quanto com os usuários desse serviço. Essa foi uma forma que nós achamos de potencializar a discussão nessa data”, evidencia o coordenador. 

De acordo com o Bruno, essas atividades ainda proporcionam uma amplitude cultural, já que existem diversas parcerias com áreas do cinema, da fotografia e da cultura, que são componentes importantes para trazer essa discussão da saúde mental como tema transversal: 

“É importante pensar a saúde mental dessa população, mas pensando num campo bem mais amplo. Isso porque a saúde mental é acesso, é combate à privilégios, é inclusão, é igualdade de participação e de direitos, é inclusão cultural, é inclusão na educação, é condições de trabalho dignas”, conclui Bruno.